Presidente da FBH, Tania Maria Onzi Pietrobelli responde a algumas perguntas enviadas por lideranças das 25 associações estaduais filiadas à Federação
Por Madson de Moraes
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Tania Maria Onzi Pietrobelli preside a Federação Brasileira de Hemofilia (FBH) e, de lá para cá, inúmeras ações e projetos foram criados para levar qualidade de vida e tratamento adequado para os pacientes com coagulopatias hereditárias no Brasil, além de atuar junto às entidades governamentais para assegurar os direitos conquistadas por essa população. As perguntas que a presidente responde nesta entrevista da Fator Vida foram elaboradas em conjunto com líderes de todas as 25 associações estaduais filiadas à FBH. As questões abordam as ações promovidas pela Federação nestes últimos anos, os projetos em andamento para fortalecer o trabalho das associações, as iniciativas para apoiar hemocentros e as conquistas que ainda faltam para as pessoas com hemofilia no País, entre outros assuntos.
A FBH completou 45 anos em 2021. Quais as conquistas que ainda faltam para as pessoas com hemofilia no Brasil?
Sabemos que temos muito a comemorar nesses 45 anos de existência da FBH, conquistas sólidas pelo trabalho responsável, permanente e de muita parceria junto aos Três Poderes e Centros de Tratamento de Hemofilia. Já conquistamos muito, mas a busca de conquistas é permanente e o que sempre nos move e moverá é o tratamento adequado para todos. A frase é curta, mas para alcançarmos esse objetivo o trabalho é grande e constante, precisamos de compromisso e persistência junto aos Três Poderes levando nossas demandas com propostas e dados. Graças à credibilidade e reconhecimento construídos durante os 45 anos de existência, temos sido ouvidos e tido bons resultados e assim continuaremos nessa missão, que é de todos os dias. Nesses tempos difíceis de pandemia do Covid-19 conseguimos garantir o tratamento para todos e ampliar o tratamento domiciliar para dois meses, isso demonstra que trabalho sério, responsável e árduo traz resultados positivos.
Como a FBH tem fortalecido o trabalho das associações de pacientes?
A FBH considera fundamental que cada estado seja representado junto a esta, por isso temos oferecido vários programas de capacitação para nossas associações estaduais filiadas. Um deles é “FBH Convida”, que está em sua 4ª edição e fornece ferramentas de gestão, estruturação e regularização da Associação, além de promover educação sobre tratamento médico e alternativas para atenção multidisciplinar. Outra iniciativa é o “Juntos pela Hemofilia”, que reuniu em torno de 700 participantes em suas duas edições, incluindo os líderes de todas as associações estaduais filiadas e dos Centros de Tratamento de Hemofilia de todo o Brasil, o evento desse ano acontecerá em setembro de forma online para atingirmos um público ainda maior. A FBH também está implementando a plataforma informacional “Tuguy”, inédita no mundo, que melhorará a adesão e o tratamento. E, claro, cito o programa “Eu no Controle”, que disponibiliza informações e materiais educativos, revisados pelo Comitê Científico da FBH, também participamos de várias lives da Coalición de Las Américas e WFH e da Federação, contando com profissionais renomados para educação das Associadas e os Hemocentros de seus estados. Além disso, temos disponibilizado recursos financeiros para as associadas desenvolverem suas ações nos estados, incluindo para o Dia Mundial de Hemofilia. Estes são alguns programas que têm objetivo de fortalecer as Associadas e muitos outros estão por vir.
Quais as iniciativas da FBH para apoiar aqueles hemocentros que apresentam dificuldades?
A FBH, assim como a World Federation of Hemophilia (WFH), reconhece e tem investido muito na educação sobre a importância do correto diagnóstico, que se inicia desde a forma como é feita a coleta do sangue até o resultado. Para isso, a FBH tem um projeto junto com a Novo Nordisk Haemophilia Foundation (NNHF) para capacitar hemocentros estaduais que apresentam dificuldades operacionais como, por exemplo, a falta de coagulômetros e reagentes. Fizemos uma pesquisa entre os hemocentros coordenadores dos estados e identificamos que seis estados ainda não realizavam diagnóstico e necessitavam encaminhar suas amostras para outros estados. Conseguimos doar, então, por meio desse projeto, quatro coagulômetros e reagentes, além de realizar a capacitação dos profissionais do Acre, Amapá, Rondônia e Sergipe a fim de que se estruturem. A partir daí, cada Associação Estadual Filiada junto com o Hemocentro pleiteiem a continuidade desse material.
Sobre o tratamento para os pacientes com hemofilia que estão com sequelas, há previsão de que o SUS retorne a fazer as cirurgias de próteses?
A questão relacionada às cirurgias ortopédicas para pessoas com hemofilia que desenvolveram sequelas articulares, por falta de tratamento profilático antes de 2012, tem trazido grandes desafios para a Federação. Em um primeiro momento, a referência para os pacientes do Brasil era o Hospital das Clínicas de Curitiba, o Hospital das Clínicas de São Paulo, para os pacientes paulistanos, e alguns poucos em outros estados. Mas, com a suspensão das cirurgias em Curitiba, tudo parou. A FBH tenta há alguns anos, desde a ampliação do orçamento que triplicou a compra de fatores de coagulação, que o Ministério da Saúde resolva essa demanda. Foi tentado pelo SUS, junto ao Instituto de Traumatologia e Ortopedia (INTO), mas nesta entidade o Ministério da Saúde (MS) não obteve sucesso na priorização da hemofilia. Agora a FBH está propondo um projeto junto ao MS para que essa população tenha prioridade nas cirurgias ortopédicas pelo SUS, bem como que as próteses utilizadas sejam de longa durabilidade. Isso se justifica por se tratar de uma população jovem e que sofre as consequências da inexistência do tratamento preventivo no passado. Esperamos que o governo se sensibilize, reconhecendo a urgência das cirurgias e que consiga dar continuidade ao projeto, visto que esta população, segundo levantamento feito, em torno de 600 pessoas com hemofilia no Brasil sofrem com sequelas e dores permanentes.
Quais têm sido as estratégias para avançarmos no tratamento dos pacientes com hemofilia nos municípios?
Sabemos que temos muito a comemorar nos 45 anos de existência da FBH, conquistas sólidas pelo trabalho responsável, permanente e de muita parceria junto aos Três Poderes e Centros de Tratamento de Hemofilia. Temos hoje um fluxo que se inicia no Ministério da Saúde com a Coordenação Geral de Sangue e Hemoderivados (CGSH), órgão em que as coagulopatias hereditárias estão inseridas, com a compra centralizada dos fatores de coagulação, o que otimiza os recursos. Esse fluxo segue com os hemocentros coordenadores na capital de cada estado e hemocentros regionais, que têm a responsabilidade de oferecer tratamento multidisciplinar, bem como registrar junto ao Ministério da Saúde, pelo Sistema WebCoagulopatias, os dados e consumo dos pacientes para que possam ser desenhadas as políticas públicas o mais próximo das demandas dessa população. Temos desenhado a Portaria de Atenção e Cuidados para as pessoas com Hemofilia, von Willebrand e outras Coagulopatias Hereditárias, que segue em revisão e tem o objetivo de harmonizar a atuação da tripartite (esferas federal, estadual e municipal). Essa construção será feita entre MS, CONASS e CONASEMS com a participação do Controle Social através da FBH, que é a representante oficial das pessoas com coagulopatias hereditárias do Brasil. Nesses 45 anos, o país se tornou referência mundial e ainda temos muito a conquistar, com passos firmes e sustentáveis para que cada geração tenha melhores tratamentos que a ciência nos traz. Gratidão a todos que se unem pela causa, incluindo os anônimos que nos bastidores estão juntos nessa missão.
Qual a importância da equipe multiprofissional no tratamento dos pacientes com hemofilia?
A hemorrede pública tem grande responsabilidade e deve disponibilizar estrutura de atenção multidisciplinar, uma vez que a Coagulopatia Hereditária pode alterar diversos sistemas fisiológicos do indivíduo, impondo acompanhamento clínico de maior complexidade em seu tratamento. Sabemos que, diante do resultado do diagnóstico, pacientes e seus familiares precisam ser acolhidos e ouvidos. É um momento muito difícil e que necessita de todas as respostas, quantas vezes forem necessárias, para que cada um absorva aquela nova realidade e assim entender que é possível superar com o apoio de toda equipe multidisciplinar da qual o paciente ou familiar possa sentir-se parte. Por isso, a grande importância das associações estaduais filiadas à FBH para que, em seus estados, se mobilizem junto às secretarias de saúde estaduais e municipais e aos Poderes, conscientizando-os de suas responsabilidades perante a Unidade Federada, quanto aos recursos humanos e físicos, fundamentais para que o tratamento disponibilizado pelo MS chegue adequadamente a todos os pacientes.